samedi 27 octobre 2007

Eis que estou à porta e bato

Após ter ouvido o testemunho de Sujo John, um jovem executivo indiano residente nos EUA, que escapou miraculosamente ao atentado de 11 de setembro de 2001 contra o World Trade Center (convidado especial de minha igreja – Communauté Crétienne du Point du Jour – região parisiense), não pude escapar a uma reflexão que resolvi trazer para este blog.

É muito comum na mídia internacional ou mesmo em ambientes não cristãos, assistirmos a tentativas de comparações, teológica e historicamente injustas (e vou mostrar porque), entre as imagens públicas de alguns grandes líderes que marcaram a história da humanidade. Notáveis e dignas de nota, são aquelas análises que igualam líderes religiosos em poder e originalidade, colocando na mesma plataforma de homens iluminados nomes como o de Maomé, Buda ou Jesus (pra ficar apenas com três), como se adeptos fossem de capacidades super, sobre ou extra-humanas.

Tais comparações, podem ser consideradas historicamente injustas por que desconsideram a dimensão e amplitude da influência de Jesus na história dos homens (nada contra Maomé ou Buda). Há também uma injustiça – ou erro – teológica(o), em função de uma diferença fundamental, imperceptível aos insensíveis e não nascidos de novo: as novidades propostas por Jesus anunciam um Deus cuja essência e natureza simplemente desqualifica todas as concepcões que se dizem portadoras de um discurso divino.

Por que? Porque há uma ousada revelação de um Deus único, não apenas no sentido monoteísta da palavra. Autêntico, mas num sentido que transcende a noção de único. E não apenas porque Jesus fala enquanto Deus e como o filho do próprio Deus, guardando e, ao mesmo tempo, expondo uma correlação nunca antes revelada. Há uma cumplicidade incondicional entre Eles: “Respondeu Jesus: Se alguém me ama, guardará a minha palavra; e meu Pai o amará, e viveremos para Ele e faremos nele morada” (Jo 14.22). Mas, também e principalmente, porque, ao contrário dos deuses apregoados por Maomé ou Buda – que devem ser e são objetos da procura humana e alvos de um exercício disciplinado, matemático, de busca por parte de seus fiéis, cuja intenção confunde-se com a causa de suas próprias existências divinas – o Deus anunciado por Jesus, na condição de autor da palavra que pronuncia, se dispõe, procura, encontra e, até mesmo, espera por aqueles a quem chama de filhos: “Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele, comigo” (Ap 3.20).

Ele não apenas está à porta, mas bate nela, avisa que está ali, disponível, pronto para entrar e, como vemos, toma - Ele mesmo - a iniciativa e diz claramente que vai entrar, cear e se alimentar junto. Nas entrelinhas do texto, expõe seu próprio desejo: quer entrar! Ao homem, basta que abra a porta.

Estamos diante, portanto, de uma diferença crucial, que deve ser considerada. De deuses passivos, a um Deus ativo. De deuses que se escondem atrás de exercícios permantentes e inacabáveis de disciplina e ação pessoal, a um Deus que se mostra, que se auto-apresenta. De deuses que devem ser procurados e achados, a um Deus que procura e está à porta. E mais: se for procurado, será achado.

Muito além das imagens de líderes que marcaram, de alguma forma, a história da humanidade, objetos da mídia mundial ou alvos de discípulos à procura de algo que preencha seu vazio existencial, vemos um Deus sem mass media, que atua, age e transforma a própria história. Autêntico. Único a mostrar os sinais de seu próprio sacrifício e as marcas dos cravos nas mãos, depois da cruz.

Por Fernando Lobo

mercredi 24 octobre 2007

Crer contra a esperança

Dois fenômenos têm estado muito presentes na história do cristianismo europeu ocidental: de um lado, o processo de descristianização crescente que marca significativamente a vida espiritual de alguns países e, por outro, de forma aparentemente contraditória, a insistente esperança de um re-avivamento espiritual presente no e a partir do meio cristão.

O caso da França é exemplar. A última pesquisa CSA/Le Monde des religions (2005) indica que 51% da população francesa se declara católica, contra 67% em 1994. Queda que indica uma tendência aparentemente em ascensão. Do restante da população, 31% se dizem sem religião (23% em 1994), 4% são mussulmanos, 2% ou 3% protestantes, 1% judeus...

Contudo, não está apenas aí o principal indício de uma crescente descristianização da sociedade francesa, comemorada pelo movimento Liberté Egalité Laicité, que defende uma laicização plena e completa no país. A mesma sondagem esclarece também uma outra tendência: 67% daqueles que se declaram católicos ignoram o sentido da festa de Pentecostes, 57% não crêem no dogma da Trindade e 50% não estão convencidos da própria existência de Deus. As palavras do bispo católico Christophe Dufour, publicadas no diário françês Le Figaro, em fevereiro de 2007, são enfáticas: as referências cristãs na sociedade francesa “correm o risco de serem lançadas no domínio da arqueologia como os templos da Roma antiga”.

Diante disso, não é necessário muita reflexão para perceber que não se trata de uma situação que atinge apenas o catecismo, a liturgia e os dogmas do catolicismo francês. Há um fenômeno de ampliação não apenas da descrença, mas da negação de Cristo e dos valores cristãos, que extrapolam os limites da religião pura e simples e traz consequências inevitáveis: para além da solidão – bastante comum entre os franceses –um grande índice de suicído (o de Paris é um dos maiores do mundo) e a instabilidade da estrutura familiar, com alta frequência de casamentos desfeitos (tome-se como amostra o divórcio exemplar, acompanhado e explorado pela mídia nacional, do presidente recém eleito Nicolas Sarkozi e sua ex-esposa Cecília).

Como vemos, um terreno acidentado e espinhoso para cerca dos 2% ou 3% da população do país, conhecida como protestantes: pastores, missionários, homens e mulheres nascidos de novo e Igrejas inteiras que sabem que não apenas a França, mas toda a Europa, são territórios estratégicos para a ação das hostes e postestades do mal, cuja presença em peso tem recriado cenários dignos das caricaturas renascentistas ou barrocas do inferno. São milhares de almas cativas, dominadas, vivendo e caminhando a passos largos na direção contrária daquela proposta por Deus.

Neste contexto, evangelizar, orar, implorar, interceder por um reavivamento espiritual é mais do que contraditório, é necessário. É, como fez Abrãao, crer contra a esperança. Trata-se de uma questão de evangelização persistente (como se pudesse ser de outra forma). Noutras palavras, é preciso re-anunciar o Evangelho, re-começar e re-estabelecer um novo padrão de diálogo e comunicação com almas não apenas calterizadas pelo individualismo pós-moderno, mas armadas até os dentes pela lembrança de uma experiência traumática que a história de um catolicismo exacerbado acabou por delimitar, alimentar e manter.

Neste território hostil, é fundamental lançar a semente e esperar em nosso Deus eterno e imutável que seja farta a colheita. Indispensável, também, anunciar as grandezas daquele que nos chamou das trevas para a Sua maravilhosa luz e as boas notícias do Evangelho de Jesus. Que tem o poder de mudar não apenas tendências e perspectivas apontadas por sondagens humanas, mas de alterar o próprio rumo da história dos homens.


Por Fernando Lobo

Pensando sobre o ser igreja


Falar de igreja, nunca é falar de um local sagrado, de um templo construído por mãos humanas, de um altar de granito, de vitrais maravilhosos, de grandes organizações e estratégias ou de um movimento religioso, seja ele qual for. Basta ler o Novo Testamento e você vai perceber isto.Falar de igreja, na verdade, é falar de vida compartilhada, de fé compartilhada, de amor compartihado, de misericórdia compartilhada, de necessidades compartilhadas, de dores e alegrias compartilhadas, de graças, serviços e dons compartilhados, de afetos compartilhados, de choros e risos compartilhados, de um caminhar em Deus, no chão da existência, compartilhado.Na visão de Jesus, o templo somos nós, o altar é o coração, o sagrado está na vida criada à imagem e semelhança de Deus e no Deus Criador de toda a vida; a adoração que o Pai procura é a rendição da intimidade do ser a Deus no dia a dia da existência; as verdadeiras riquezas só cabem no coração; o estar juntos é para nossa edificação e crescimento; algo que jamais devemos negligenciar ou colocar de lado, porque estamos, agora, mais pertos da vinda de Jesus, do que quando, no princípio cremos; a pregação é a proclamação da Palavra que anuncia a boa nova de Jesus e que nos instrui, ensina, corrige, encoraja, edifica e consola na caminhada; o Corpo é para que as pessoas levem as cargas umas das outras, orem umas pelas outras, socorram umas às outras em suas necessidades, dividam alegrias e tristezas, lutas e vitórias; experimentem juntas a largura, a altura, o comprimento e a profundidade do amor de Cristo, até que sejamos tomados de toda a plenitude de Deus.Igreja não é um evento, um congresso, uma conferência, atividades ou um projeto. Igreja são vidas que caminham juntas seguindo Jesus; gente que crê e confessa Jesus como seu Senhor; gente quebrada, imperfeita, que tem problemas e limitações, que chora, que luta e que é humana; mas que está sendo aperfeiçoada pela graça de Deus e que insiste no compromisso de andar em comunhão. Igreja fala de pessoas que têm nome, olhos, rosto, mãos, histórias, risos e lágrimas, dúvidas e certezas, momentos de fraqueza e de força. Igreja são pessoas por quem oramos e que oram por nós, gente com quem compartilhamos nossas angústias e dores, mas também nossas alegrias e momentos bons; pessoas a quem encorajamos e por quem somos encorajados na caminhada da fé.Não somos juízes dos nossos irmãos: somos irmãos. Não estamos aqui para ter domínio sobre a fé dos nossos irmãos; mas, para compartilhar da sua alegria na fé em Jesus. Não estamos aqui para responder todas as perguntas, mas para sermos fraternalmente amigos e nos compadecermos uns dos outros. Não estamos aqui para controlarmos a entrada do céu; mas, para anunciarmos as grandezas daquele que nos chamou das trevas para a Sua maravilhosa luz e as boas notícias do Evangelho de Jesus. Não estamos aqui para condenar; mas, para amar, perdoar, expressar graça e compaixão, ser sal e luz, fazer diferença para o bem.Que possamos olhar para Jesus e reencontrar o verdadeiro sentido do ser igreja.

Por Alexandre Guzzardi, pastor brasileiro residente na Inglaterra.